Sou uma daquelas pessoas que ficam fulas da vida quando lhes
querem dar a volta para comprar algo de que não precisam. Sempre que me começam
a vender a banha da cobra, embrulhada no mais fino chiffon de seda, e me
obrigam a decidir, na hora, se quero ou não aderir ao clube dos tansos, começa
a passar-me uma luz branca à frente dos olhos. Depois a vista fica turva,
seguidamente com picos e finalmente apodera-se de mim uma vontade incontrolável
de utilizar a radiação ultravioleta, que entretanto foi gerada pelo nervo óptico, e fulminar o “vigário” que está à minha frente. Por isso, nunca comprei nenhum
colchão que trouxesse, como oferta, um trem de cozinha, um equipamento de
limpeza a vapor, um serviço de jantar “cozinha velha” de 99 peças, um
faqueiro banhado a ouro de 1 quilate e meio, uma máquina de cozer ovos, uma
máquina de passar a ferro sentada, uma máquina de aparar os pelos do nariz, e
outros que tais que, por vezes, nem se sabe muito bem qual a sua utilização e
importância. Por tudo isto, o discurso do “Por
se tratar de uma promoção que termina hoje, tem de decidir agora, senão não
terá direito às ofertas” não cola e saio sempre muito orgulhosa por não ter sucumbido ao delírio de um
consumismo desenfreado, estimulado por técnicas de extorsão já gastas mas, ainda assim, sempre
tão eficazes.
O meu problema é outro. Por exemplo, não consigo ir ao cabeleireiro sem
trazer de lá qualquer coisa! E mesmo que ainda tenha uma caixa daquelas ampolas
que evitam que o couro cabeludo desidrate com o stress do quotidiano, com o frio e com os secadores, lá levo
debaixo do braço um champô-leite hidratante para pelas ultra-sensíveis. E se
vou à loja, é a mesma coisa: vou destinada a comprar apenas o champô e saio de
lá com a máscara e o serum que têm, obrigatoriamente, de ser utilizados em
simultâneo, não vá ficar careca. Já que lá estou, aproveito para trazer um
verniz novo - que na verdade só é 1/8 de tom acima do último que tinha levado -
e mais uma espuma de cabelo, desta vez para acabar com o demodé efeito molhado,
conferindo um aspecto, sem qualquer sombra de dúvida, muito mais natural - tão
natural, que nem parece que levou espuma nenhuma. Mas podia ser pior! A uns dá
para a roupa, para os jogos de computador ou para o futebol. A mim dá-me para os champôs,
para os cremes, para as maquilhagens e tudo o resto que tenha a ver com o
bem-estar da pele, do cabelo e do corpo! Para isto e para as compras do
supermercado! Mas isso é outra conversa… (Não sei porquê, mas de repente fiquei com a sensação de que, com estas palavras, transmiti uma ideia de
futilidade extraordinariamente desenquadrada da actual conjuntura… Não é nada
disso! Passo a explicar. Vou raríssimas vezes às compras. O problema é não
utilizar as coisas que entretanto vou adquirindo…)
Referindo-me finalmente ao grão de arroz que caiu esta 2ª
feira (juntamente com o temporal que assolou o país), passo a concretizar o
motivo pelo qual hoje aqui estou. Depois de estudar as várias ofertas de ginásios,
de ter resistido ao “para não pagar a jóia tem de se inscrever, impreterivelmente, hoje” e de ter
feito uma tabela em EXCEL com as mensalidades, distâncias e vantagens e
desvantagens da coisa, lá decidi inscrever-me num ginásio que fica… “do outro lado da ponte”. Calma! Desta vez
tem a sua lógica: posso frequentar um que existe perto do meu palácio, que pertence
ao mesmo grupo. E lá fui eu ontem, debaixo da chuva, no meio do trânsito, para
a “longínqua cidade em que eu não trabalho nem vivo”, a pensar que ia fazer uma
avaliação física, de forma a tornar o meu treino mais eficiente. Surpresa das
surpresas, afinal queriam fazer-me uma avaliação de SPA. Avaliação de SPA??
Estão a gozar comigo? A um dia 14 de Fevereiro? Com esta chuva e este trânsito?
Aiiiii!!! Lá vem a luzinha branca outra vez...
Enquanto aguardava pela terapeuta,
consegui controlar a fúria e comecei a ensaiar em silêncio o discurso de alguém
que “de modo algum me vão apanhar nesta,
nem que vendam creme de baba de caracol”:
- “Desculpe, mas vou-me embora”;
- “É inadmissível que eu tenha ligado para cá à hora do almoço a perguntar se era uma avaliação física e me tenham confirmado essa informação”;
- “Esta atitude só mostra uma enorme falta de profissionalismo da vossa parte”;
- “Chamarem uma pessoa cá ao engano para lhe venderem depilações, manicures e massagens…”.
Lá chegou a terapeuta e eu, ceguinha, ceguinha, entre olhos
arregalados e tentativas para não me cuspir e espumar toda com a raiva, lá
mostrei o meu desagrado (à excepção da parte das depilações e das unhas, claro, porque até nestas ocasiões é preciso manter o nível!).
Conclusão: comprei uma "Massagem de Pedras Quentes" para a minha metade boa… Coitadinho! Só fiz isso porque ele merece e um perfuminho parecia-me tão pouco! Até me fez um jantar romântico com massa filo em forma de corações, com entrada, prato principal e sobremesa! E acendeu, ao contrário dos seus princípios, velas! E das vermelhas! Merecia uma prendinha EXTRA, pela EXTRema dedicação e EXTRAordinário empenho! Ainda por cima a massagem está naquela lista das poucas coisas que compro, como os champôs e os cremes, uma vez que é em prol do bem-estar do corpo e da alma. Até devia dar para por no IRS, em despesas de saúde. Foi só por isso que me permiti “ter sucumbido ao delírio de um consumismo desenfreado” e me deixei levar pelas “técnicas de extorsão já gastas”… Por isso e por uma massagem terapêutica que as minhas costas receberam como "incentivo" à compra!
Conclusão: comprei uma "Massagem de Pedras Quentes" para a minha metade boa… Coitadinho! Só fiz isso porque ele merece e um perfuminho parecia-me tão pouco! Até me fez um jantar romântico com massa filo em forma de corações, com entrada, prato principal e sobremesa! E acendeu, ao contrário dos seus princípios, velas! E das vermelhas! Merecia uma prendinha EXTRA, pela EXTRema dedicação e EXTRAordinário empenho! Ainda por cima a massagem está naquela lista das poucas coisas que compro, como os champôs e os cremes, uma vez que é em prol do bem-estar do corpo e da alma. Até devia dar para por no IRS, em despesas de saúde. Foi só por isso que me permiti “ter sucumbido ao delírio de um consumismo desenfreado” e me deixei levar pelas “técnicas de extorsão já gastas”… Por isso e por uma massagem terapêutica que as minhas costas receberam como "incentivo" à compra!
Então... a conclusão é que compensa ludibriar uma pessoa porque sempre se vende alguma coisinha?
ResponderEliminaro título deste post foi uma das PIORES invenções de todos os tempos!! torna completamente banal o que poderia ser um drama!! isso e as "técnicas de extorsão já gastas" que, infelizmente, continuam a surtir efeito em mim... :(
ResponderEliminarpassando à frente os episódios de ira explosiva, acho que fizeste muito bem em mimar a tua metade boa, porque "amor com amor se paga!" :)